Usucapião de unidade: quando suspender rendimentos ao investidor hoteleiro?

Imagine a seguinte situação: seu empreendimento recebe uma notificação judicial informando sobre uma ação de usucapião referente a uma das suas unidades. A ação é movida por uma parte que alega ter a posse do imóvel e, por isso, busca a propriedade. Ao mesmo tempo, surge uma dúvida crucial: para quem pagar os rendimentos da unidade? Ao proprietário que consta no registro, ou à parte que entrou com a ação de usucapião?
Essa é uma situação delicada que exige cautela e conhecimento jurídico para proteger o empreendimento e evitar riscos desnecessários. Vamos entender o que fazer.
O que é Usucapião e sua relação com a propriedade
A usucapião é uma forma de adquirir a propriedade de um bem (seja ele móvel ou imóvel) pela posse prolongada e ininterrupta, desde que atendidos requisitos legais específicos, como determinado tempo de posse e outras condições.
No cenário que estamos tratando, uma parte alega ter a posse de uma unidade e, por isso, busca na justiça o reconhecimento de sua propriedade via usucapião.
Quem é o verdadeiro "dono" do imóvel (e dos rendimentos)?
A questão central aqui é a propriedade. Os rendimentos de uma unidade são, por natureza, os "frutos do imóvel". Portanto, eles devem ser pagos aos proprietários legais do imóvel ou a uma pessoa por eles formalmente indicada.
Na situação apresentada, o imóvel ainda está registrado em nome dos proprietários originais ou, em alguns casos, até mesmo em nome da construtora. Enquanto não houver uma sentença judicial transitada em julgado que declare a usucapião ou o registro de uma compra e venda na matrícula do imóvel, a propriedade legal do imóvel não foi transferida para a parte que alega a usucapião.
Isso significa que, do ponto de vista legal, os proprietários que constam nos registros públicos são os legítimos detentores do direito aos rendimentos da unidade.
O dilema do pagamento de rendimentos e a solução: Consignação em Pagamento
Diante dessa incerteza sobre quem é o verdadeiro credor dos rendimentos da unidade — os proprietários registrados ou a parte que alega a usucapião —, o empreendimento se encontra em uma situação de dúvida razoável sobre a quem pagar.
Nesses casos, a medida mais prudente e legalmente segura é a suspensão imediata do pagamento dos rendimentos e a realização da consignação em pagamento dos valores.
A consignação em pagamento é um procedimento legal, previsto no Artigo 335 do Código Civil, que permite ao devedor (o empreendimento, neste caso) depositar judicial ou extrajudicialmente o valor devido quando:
• Há recusa do credor em receber.
• Há dúvida sobre quem seja o legítimo credor.
• O credor não foi localizado.
Ao realizar a consignação, o empreendimento se libera da obrigação de pagar e evita o risco de ser cobrado duplamente ou de responder por juros e mora.
Passos para proteger o empreendimento:
1. Notifique os proprietários atuais: Avise formalmente os proprietários que constam no registro sobre a existência da ação de usucapião. Formalize essa comunicação por e-mail e/ou qualquer outro meio escrito que comprove o recebimento.
2. Informe sobre a suspensão dos rendimentos: Na mesma comunicação, informe que, por precaução e devido à controvérsia judicial, o empreendimento suspenderá o pagamento dos rendimentos referentes à unidade em questão.
3. Realize a consignação extrajudicial: Deposite os valores dos rendimentos em qualquer banco (ou no banco de titularidade do suposto credor, se souber). O comprovante do depósito é a sua prova de que a obrigação foi cumprida.
• Custos da consignação: O banco pode cobrar uma taxa para o serviço de consignação. Verifique se o contrato de pool ou a convenção permite que esse valor seja descontado da unidade, já que a situação foi gerada pela controvérsia envolvendo-a.
4. Mantenha a documentação organizada: Guarde cópias da notificação judicial de usucapião, das comunicações com os proprietários e dos comprovantes de consignação. Essa documentação será fundamental em qualquer eventualidade.
Conclusão: Cautela e legalidade são essenciais para evitar riscos
A situação de uma ação de usucapião envolvendo uma unidade é complexa e exige uma resposta jurídica cuidadosa. Suspender o pagamento de rendimentos e realizar a consignação em pagamento é a medida mais segura para o empreendimento, garantindo que não haverá pagamentos indevidos e que a empresa estará protegida em um eventual litígio.
Sempre que situações como essa surgirem, busque imediatamente o apoio de sua assessoria jurídica.